segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Um texto interessante do transcrito do blog - http://musicadiscreta.blog.uol.com.br.

Da Crítica e do Ensino Musical ou POR QUE NOSSOS INTELECTUAIS TEMEM A MÚSICA?

Há uma espécie de pavor secreto e silencioso que assalta educadores, profissionais e pesquisadores de comunicação quando o assunto é música. Via de regra, o remédio paliativo para esse desconforto, que aflige indistintamente professores, jornalistas e acadêmicos, é a mistificação.

Mão Guidoniana (sinais manuais para simbolizar as notas) - Manuscrito do século XV

Transcrevo a seguir uma inquietante reflexão da musicóloga portuguesa Maria Alzira Seixo acerca da linguagem musical e suas ainda mal compreendidas especificidades sígnicas.

Fragmento da partitura gráfica de Fontana Mix, do norte-americano John Cage (1912-1992).

[...] a música é uma arte “à parte”: na formação implicada pela cultura geral (a música é a única arte que não diz rigorosamente nada, quando todas as outras figuram significações particulares de apreensão imediata a determinado nível) e na formação específica conducente a uma prática (para produzir literatura, parece bastar saber escrever; para produzir a maioria das artes plásticas, parece bastar saber manejar certos objectos com características impressoras, de modo a desenhar um traço, manchar uma cor ou marcar um material moldável; ora para produzir música há que atravessar uma barreira de séria iniciação que é a da notação musical e das suas regras).


O compositor vienense Arnold Schoenberg (1874-1951)

Assim, a música aparece em geral como uma arte de prática mais distanciada das hipóteses de produção comuns. Por outro lado, a sua percepção incorpórea, não objectual, é difícil de ser trabalhada criticamente no plano amadorístico e não pode facilmente ser desviada do tipo de recepção especializado (ou, mais latamente: “alfabetizado”), a não ser em termos emocionais, psicológicos, de puro gosto não intelectualizado, de empatia sem efectiva intelecção.

Assim, há uma espécie de “terrorismo” que a prática do envolvimento musical pratica e que faz com que, em certas situações, intelectuais brilhantes confessem apressadamente ( como quem se desculpa – ou como quem se afasta do problema; e é esta segunda atitude, que no fundo está na base da primeira, que radicalmente consideramos incorrecta) que “não percebem nada de música”, quando muito mais dificilmente confessarão que “não percebem nada de literatura”, ou “de pintura”, ou “de fotografia”, ou “de cinema”, ou de qualquer outra manifestação artística.

O compositor Hans-Joachim Koellreutter (1915-2005) e o pianista Sérgio Villafranca lêem a partitura esférica de Acronon

E cremos que tal sentimento de “terrorismo” reside principalmente no facto de que a música não põe de imediato uma significação à discussão (figura ou idéia), ou da consciência que se tem, pelo menos, de que ela não é contornadamente sensível. Já se disse várias vezes que a música é a arte do significante puro e que uma semântica musical só adentro do universo sonoro pode ser buscada (SEIXO, Maria Alzira: in SEMIOLOGIA DA MÚSICA).

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